A Canoa Encantada
Foi de dentro do corpo do escuro, quando as chamas da fogueira se apagaram, que a voz do velho índio Kamaiura se levantou dizendo assim:
"Eu vou contar. Eu vou contar agora:
No meio do mato, no meio da noite escura, um pescador adormeceu dentro de sua canoa, junto ao pé de Jatobá que crescera belo e forte perto da lagoa. No meio de seu sono, ele sonhou que cortava a casca do Jatoba para fazer uma canoa.
Ele demorou alguns dias neste trabalho. Ao terminar de fazer a canoa sua mulher, que estava grávida, deu à luz um filho. Assim, com o filho recém-nascido, ele não pôde trabalhar e não pôde arrastar a canoa para dentro da água. Ela ficou ali, no meio do mato, junto ao pé de Jatobá.
Alguns dias depois, o pescador já podia trabalhar e voltou ao lugar onde tinha deixado a sua canoa. Para sua surpresa, ela não estava lá. Entristecido, ele sentou-se junto ao pé de Jatobá e ficou pensando nos peixes, nos bichos, nas plantas e nas coisas. De repente, ouviu um barulho e logo depois viu a canoa se arrastando no meio do mato. Ele levou um susto e pensou: 'Minha Canoa virou um bicho e já pode andar sozinha.' Ele se encheu de coragem e, um pouco desconfiado, entrou na canoa e disse: '- Você me leva para a lagoa?' A canoa começou a se arrastar e entrou na água. Os peixes começaram a pular para dentro dela e ela comeu todos eles. Em seguida, outros peixes pularam para o seu interior e ela deu esta segunda pescaria para o seu dono.
O pescador deixou a canoa junto ao pé de Jatobá e levou os peixes para casa. Sua mulher, seus filhos e seus amigos ficaram maravilhados, fizeram muitas perguntas, mas ele manteve o bicho-canoa em segredo.
Dias depois, ele voltou para pescar, mas não encontrou a canoa junto ao pé de Jatobá: ela estava viajando. Ele ficou impaciente, mas resolveu aguardar.
Algum tempo depois ela chegou, ele entrou nela e foram os dois para a lagoa. Tão logo entrou na água, os peixes novamente pularam para dentro da canoa. O pescador quis pegar todos os peixes para ele, mas quando começou a juntá-los foi engolido pela canoa, que estava muito zangada: os primeiros peixes deveriam ser sempre para ela - o pescador fora muito apressado e ganancioso.
Uma folha com formato de peixe caiu sobre o rosto do pescador. Ele despertou assustado e saiu correndo por esse mundo afora procurando a canoa que estava encantada."
esta forma, você poderá voar até perto da sua amada e ficar com ela, nos céus, para sempre".
Já cheio de saudades da indiazinha, o rapaz disse que sim. O velho bruxo carajá fez, então, a sua magia, e o índio foi transformado em um bonito vento.
O índio-de-vento começou a subir em direção aos céus mas, quando já estava bem alto, virou-se em direção à Terra e percebeu o brilho da estrelinha amada refletido nas águas, lá embaixo. Irritado, voltou-se em direção ao reflexo o mais depressa que podia. E alcançou grande velocidade.
O pai do moço, que assistia a tudo apavorado, pediu ao feiticeiro:
"Faça alguma coisa, depressa, antes que meu filho se arrebente todo! Apague as estrelas! Apague as estrelas, rápido!"
O grande bruxo índio queria atender o pedido daquele pai desesperado, mas sabia perfeitamente que era impossível apagar as estrelas. Então, ele teve uma idéia:
"Vou criar a Lua", disse. "Assim, a luz desse novo astro fará com que o reflexo das estrelas desapareça completamente da superfície das águas".
Assim que o índio-de-vento viu a novidade, e assim que percebeu que as estrelas não estavam mais refletidas nos rios e nos lagos, voltou a subir em direção aos céus e, lá, viveu para sempre ao lado da amada.
Que, podemos deduzir, não gostou nada do final da história!